Físico Marcelo Knobel é o primeiro brasileiro a ocupar o posto da entidade vinculada à Unesco
O físico Marcelo Knobel, que foi reitor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) entre 2017 e 2021, é o novo diretor-executivo da Academia Mundial de Ciências, vinculada à Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).
Knobel, 56, é o primeiro brasileiro a ocupar a liderança executiva da entidade, mais conhecida como TWAS, sua sigla em inglês, e tem a missão de avançar a agenda de fomento à ciência nos países em desenvolvimento. Ele terá de fazer isso em um cenário geopolítico desafiador, com guerras, aumento do protecionismo global e verbas escassas para pesquisas.
“É um orgulho representar o Brasil neste cargo e poder contribuir para a ciência e a educação do mundo todo, mas também para o país”, disse Knobel à Folha.
“O grande desafio, neste contexto geopolítico em que nós estamos, é conseguir recursos para ampliar e fortalecer as atividades”, avaliou.
Embora a TWAS seja ligada à Unesco, ela não recebe financiamento direto da organização. São as parcerias com governos e instituições que viabilizam os programas.
Sediada em Trieste, no Nordeste da Itália, a Academia Mundial de Ciências foi fundada pelo paquistanês Abdus Salam, vencedor do Nobel de Física de 1979. Lançada oficialmente em 1985, a organização teve, desde o início, o objetivo de impulsionar a pesquisa científica e a inovação em países em desenvolvimento e emergentes.
A entidade tem ainda o maior programa de bolsas de pesquisa Sul-Sul do mundo, com mais de 400 bolsas anuais para doutorado e pós-doc.
A TWAS funciona como um centro acadêmico internacional, com membros selecionados com base no mérito e na excelência de sua produção científica.
A entidade conta com uma série de programas que incluem bolsas de estudo, projetos de colaboração científica e intercâmbios, utilizando uma rede global de pesquisadores. O objetivo central é fortalecer a ciência nesses países, criando conexões e oportunidades para os pesquisadores.
Há algumas áreas que considero fundamentais, e uma delas é a comunicação pública da ciência. É algo que podemos e devemos ampliar, porque já temos o principal, que são muitas histórias de histórias de sucesso
“Queremos ainda ampliar a colaboração com outros países da América Latina, assim como com regiões que enfrentam desafios significativos, como a África e partes da Ásia”, disse o brasileiro, ressaltando que a ciência é essencial para o desenvolvimento das nações.
Além da experiência como pesquisador e integrante de projetos internacionais, a atuação de Knobel à frente da Unicamp —que aparece em entre as melhores da América Latina nos principais rankings universitários— foi decisiva para sua escolha para o novo cargo.
“O histórico excepcional de Marcelo Knobel como cientista, educador e defensor da comunicação científica o torna uma adição brilhante à Academia Mundial de Ciências. Sua liderança visionária na Unicamp, no Brasil, e seu compromisso em fomentar a colaboração científica internacional, certamente impulsionarão a missão da TWAS a novos patamares. Estou confiante de que, sob sua liderança, a academia continuará a capacitar cientistas no Sul global e a promover o poder transformador da ciência”, afirmou, em nota, Lidia Brito, diretora-geral adjunta para ciências naturais da Unesco.
Sua gestão na universidade ficou inicialmente marcada pela ampliação e diversificação das formas de acesso à instituição, com a aprovação de cotas étnico-raciais para os cursos de graduação e a criação de um vestibular exclusivo para indígenas.
Em março de 2020, Knobel foi o primeiro reitor de universidade pública no Brasil a suspender as atividades presenciais por causa da disseminação da Covid-19. Essa decisão lhe rendeu muitas críticas na época, quando a potencial gravidade do coronavírus ainda era amplamente minimizada no país.
A experiência parece lhe ter inspirado para lançar, em 2021, um livro dedicado à atuação contra a desinformação científica, batizado de “A Ilusão da Lua: Ideias para decifrar o mundo por meio da ciência e combater o negacionismo” (Ed. Contexto).
Entusiasta de projetos de popularização da ciência e de comunicação científica, com direito a podcasts e vídeos no YouTube, Knobel diz que também pretende expandir a atuação da academia nesse domínio.
“Há algumas áreas que considero fundamentais, e uma delas é a comunicação pública da ciência. É algo que podemos e devemos ampliar, porque já temos o principal, que são muitas histórias de histórias de sucesso [dos cientistas]”, disse Knobel, que venceu o principal prêmio de divulgação científica do Brasil, o José Reis, do CNPq, e foi o curador da primeira edição do prêmio Jabuti Acadêmico, em 2024.
“Outra área prioritária é a diplomacia científica, que vai se mostrando cada vez mais fundamental no mundo que vivemos hoje”, acrescentou.
“Naturalmente, meu objetivo também é organizar o que já existe e conseguir recursos para ampliar os projetos com os países em desenvolvimento.”
O brasileiro tem inicialmente um período de dois anos no posto diretor-executivo da Academia Mundial de Ciências, que pode ser prorrogado.
Fonte: Folha de São Paulo